As folhas dos plátanos
desprendem-se e lançam-se na
aventura do espaço,
e os olhos de uma pobre criatura
comovidos as seguem.
São belas as folhas dos plátanos
quando caem, nas tardes de
Novembro
contra o fundo de um céu
desgrenhado e sangrento.
Ondulam como os braços da
preguiça
no indolente bocejo.
Sobem e descem, baloiçam-se e
repousam,
traçam erres e esses, ciclóides e
volutas,
no espaço escrevem com o pecíolo
breve,
numa caligrafia requintada, o
nome que se pensa,
e seguem e regressam,
dedilhando em compassos
sonolentos
a música outonal do entardecer.
São belas as folhas dos plátanos
espalhadas no chão.
Eram lisas e verdes no apogeu
da sua juventude em clorofila,
mas agora, no outono de si
mesmas,
o velho citoplasma, queimado e
exausto pela luz do Sol,
deixou-se trespassar por afiados
ácidos.
A verde clorofila, perdido o seu
magnésio,
vestiu-se de burel,
de um tom que não é cor,
nem se sabe dizer que nome tenha,
a não ser o seu próprio,
folha seca de plátano.
A secura do Sol causticou-a de
rugas,
um castanho mais denso
acentuou-lhe os nervos,
e esta real e pobre criatura
vendo o solo coberto de folhas
outonais
medita no malogro das coisas que
a rodeiam:
dá-lhes o tom a ausência de
magnésio;
os olhos, a beleza.
António Gedeão
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